De uns anos pra cá tenho pensado muito sobre o que nos move. Qual é o combustível que nos dá fôlego pra caminhar pessoal e profissionalmente. Talvez a paixão, o amor? Realmente. Sem amor a vida fica mais pesada, mais difícil de caminhar. Paixão por algum projeto, por sua equipe de trabalho ou amor por alguém, fazem uma enorme diferença. Sem amor isso tudo perde sentido de maneira inquestionável.
Dinheiro? Claro, é um bom argumento pra seguir adiante.
Mas de todos, creio que a gratidão que se recebe de volta talvez seja o mais potente deles. É o que nos faz sentir bem até o fundo da alma. Receber uma manifestação de gratidão nos traz a certeza de que foi feito algo inegavelmente correto. Tenho pensado muito sobre isso e até escrevi algo recentemente sobre o assunto (em clique aqui), que especialmente em minha profissão é tão importante. Quando converso com um paciente em consulta ou durante uma visita no hospital, invariavelmente a conversa termina com um “obrigado”. De minha parte, tenho convicção que faço o melhor pelos meus clientes, mesmo que não tenha podido ajudar o quanto havia de expectativa. A expectativa é sempre muito subjetiva e às vezes foge um pouco da realidade e do possível.
Algumas poucas vezes, no entanto, recebo um “obrigado”, mas acrescido de “por enquanto”. Me incomoda profundamente esse “obrigado por enquanto”. Tenho a impressão de que o que pude ajudar até agora foi útil e mereceu um agradecimento que dura só até aquele momento do “por enquanto”, mas dali pra frente o cliente não será mais agradecido. Parece que dali em diante começa uma relação nova e pra que o agradecimento dure, terei que merecer mais. Às vezes me intimidando ou desafiando a fazer com que daqui em diante eu me esforce para continuar fazendo com que sinta a mesma gratidão. Parece que ao adicionar ao “por enquanto” uma palavra que expressa fundamentalmente gratidão, embute nela um prazo de validade. Parece que está prevendo que que daqui a pouco algo vai dar errado, e está pronto pra “desagradecer”. Óbvio que não acontece sempre. Mas quase sempre que acontece me faz pensar que o meu esforço profissional não foi valorizado realmente, ou que a valorização foi limitada e que a partir do momento do “por enquanto” em diante não vale mais a gratidão por ele.
Sei perfeitamente que, em quase todas as vezes, a expressão sai da boca de quem fala de maneira medular, como um reflexo, sem pensar no significado, como algo aprendido há muito tempo e que tem eventualmente sua dose de respeito, e que é uma expressão corrente que quer dizer algo como “nos veremos em breve e então poderei agradecer pela próxima etapa do tratamento ou aconselhamento”. Mas mesmo assim é uma expressão que me perturba.
Conversei sobre o assunto com um grande amigo e percebi, surpreso, que a ele também incomodava a expressão, tanto que ele já havia conversado com outro professor que também já havia refletido sobre o assunto (já são 3 perturbados pela expressão!!!). Diz ele que, nessa conversa seu interlocutor explicou sob uma outra ótica. Disse mais ou menos assim “venho escutando essa frase há anos e realmente me incomodava até o dia em que perguntei a um paciente porque ‘obrigado por enquanto’, e ele respondeu que ‘por enquanto eu somente posso lhe agradecer e nada mais tenho a lhe dar’, ou seja, por enquanto, um obrigado é tudo que ele poderia dar”. Me parece que os sábios sempre veem com mais clareza o lado otimista, e esta é uma maneira muito mais nobre e valorosa de se enxergar a situação. Mas não creio que seja realidade sempre.
De qualquer maneira, talvez o “por enquanto” depois do “obrigado” seja uma só grande implicância minha, sei lá… Ou apenas uma figura de linguagem tão sem importância que nem mereça essa reflexão.
Mas incomoda.
Por enquanto.
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