Há muitos anos sou responsável por uma pequena e específica parcela do atendimento terciário de saúde de Campinas. Recebo pacientes de toda a região metropolitana de Campinas e muitas vezes de um pouco mais distante, e acabo ouvindo as histórias de dificuldades para se fazer diagnósticos, tratamentos e acompanhamentos. Quase sempre os pacientes que recebo vêm com diagnósticos atrasados de câncer de intestino, que poderiam ter muito mais chances de cura se vistos mais cedo, mas a espera por exames e consultas de especialistas, ou mesmo os tratamentos acabam demorando muito e muitas vezes perdemos a chance de terapia adequada.
Campinas é responsável pelo atendimento especializado de saúde de algumas centenas de milhares de pessoas da região que dependem do SUS, e o atendimento básico costuma funcionar muito bem. No entanto, quando exames e atendimentos especializados são necessários, as coisas começam a ser mais difíceis; muitos pacientes esperam meses para um exame ou consulta de especialista. Já o atendimento terciário acaba sendo acessível apenas a poucos que esperam muito tempo. Internação eletiva, não urgente, é algo demorado e restrito. O número de leitos para internação disponíveis na cidade é menor que o necessário para o atendimento dessa população, gerando espera para tratamento de muitas doenças.
Como estamos em vésperas de eleição municipal para prefeitura e câmara de vereadores, não consigo enxergar um momento mais adequado para chamar atenção a esse problema.
Há alguns anos foi feita uma avaliação da situação de leitos em Campinas e a conclusão é que a cidade precisaria pouco mais de 500 novos leitos de internação para a demanda daquela época. Hoje, seriam provavelmente quase 3 novos hospitais do tamanho do Mário Gatti.
Imagine um hospital de câncer, seguido de outro para mulheres, um hospital geral, e um de crianças, entremeado de edifícios de estacionamento e administrativos, deixando o Mário Gatti apenas para urgências e emergências. A prefeitura poderia disponibilizar boa parte dos terrenos que se estende desde a ponte sobre a Av. Pref. Faria Lima até o túnel Joá Penteado. A exemplo de cidades até menores que Campinas, na Europa e Estados Unidos, caberia bem nessa região a criação de novos hospitais, gerando mais leitos de internação. Exames de média e alta complexidade poderiam ser realizados em clínicas específicas para isso, também na região, mas fora dos edifícios de hospitais, minimizando o fluxo desnecessário nestes ambientes.
Cada um deles seria muito bem-vindo para a cidade. Além disso, a criação desse “Corredor da Saúde” nessa área contribuiria também para estimular o desenvolvimento econômico da região.
Teríamos uma área na cidade de referência de hospitais onde todo o atendimento poderia ser centralizado. E hospitais especializados demandam equipes especializadas, e essas equipes entregam resultados melhores do que hospitais gerais. Não se pode esperar que profissionais especialistas em uma área possam desempenhar tão bem em outras, mas se colocados nas suas áreas de atuação poderíamos ter no SUS de Campinas os melhores profissionais de cada área.
O estímulo para nós, profissionais, seria imenso. A possibilidade de trabalhar com estrutura adequada e tratar de pacientes da forma correta e humana, nos encanta como médicos e profissionais de saúde. Ao mesmo tempo, pacientes poderiam sonhar com o melhor atendimento que se pode oferecer.
Temos, em Campinas, profissionais de alta estirpe em todas as áreas. Temos faculdades de medicina, de enfermagem e outras de saúde, tão necessárias a esse tipo de evolução. Temos administradores, engenheiros e advogados que poderiam viabilizar essa estrutura de forma correta.
Já temos na cidade serviços que funcionam perfeitamente bem, como os centros de saúde, o SAMU e até o atendimento de urgências. Precisamos de leitos de internação, e estrutura adequada de ambulatórios, exames e tratamentos especializados para dar aos nossos pacientes a chance de serem tratados mais precocemente, de maneira correta. Obviamente que entendo que o investimento é altíssimo e o retorno financeiro não existe quando o financiamento é exclusivo do SUS, mas isso pode mudar a partir de novas possibilidades, como as doações de terceiros para fundações e associações que podem melhorar a gestão desse dinheiro em prol da Saúde da cidade, a exemplo do que acontece com vários hospitais de ponta no Brasil que atendem SUS.
Que os próximos governantes enxerguem essa situação e se empenhem em melhorar a vida de nossos cidadãos.
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