Os últimos meses mostraram inúmeras pessoas falando de um conhecimento que nunca se teve. Logo no início dos relatos de Covid-19 já apareceram vários “especialistas” nessa doença. Cada um com sua certeza, colocando convicções pessoais acima de qualquer ciência ou mínimo bom senso. O tempo serviu pra nos mostrar que não sabíamos nada quando se começou a falar sobre o assunto. Ao longo dos meses foram surgindo evidências cientificas que derrubaram as convicções iniciais, uma a uma.
Com a ausência de possibilidade de contato pessoal, derrubando congressos, conferências e outros eventos científicos importantes na área de saúde, as lives, webinars e congressos virtuais surgiram como a alternativa ao conhecimento distribuído de maneira formal e habitual. Com boa parte das pessoas em casa, o conteúdo oferecido de forma virtual passou a chegar a muito mais gente, e inauguramos algo que já se vinha prevendo há muito tempo, mas que ainda não tinha tido o impulso necessário. E o melhor exemplo disso tudo é que a cada dia surgem informações sobre o corona vírus que são publicadas e disponibilizadas de forma instantânea, de maneira que nas discussões sempre há alguém que tem conhecimento de “um estudo publicado ontem”, tornando cada vez mais calorosas essas discussões.
Mas além da Covid-19, outras doenças continuam acontecendo, e muitas pesquisas e publicações continuam aparecendo. Muitos pacientes continuam sendo tratados e muitas discussões entre médicos continuam ocorrendo. A tecnologia trouxe a possibilidade de fazermos esse tipo de atividade de maneira remota e muitas vezes mais eficaz, fazendo chegar a mais gente opiniões e estudos que importam. Existem profissionais ávidos por informação, ao mesmo tempo que existem outros com conhecimento de nível altíssimo sobre determinado assunto em todo canto do mundo, que podem aproveitar as novas tecnologias para ajudar a disseminar de forma responsável.
Recentemente fiquei curioso com a quantidade de novos convites para participar de webinars e fui procurar na caixa de correio. A média de quase 10 por dia!!!! É uma quantidade de eventos que nunca se viu na história da medicina. Podem ser organizados por universidades, por profissionais, por clínicas, pela indústria farmacêutica ou de materiais médicos. Podem ser para super-especialistas, para alunos, residentes, ou para médicos generalistas. Tem pra todos os gostos.
Como exemplo, cito duas situações recentes. O Congresso latino-americano de cirurgia robótica foi transformado há poucos meses para que acontecesse 100% online. De outra maneira teria que ser suspenso. Palestras de vários especialistas, com 3 ou 4 salas em tempo real, como se estivessem mesmo num espaço de eventos com várias salas com aulas simultâneas, aconteceram para um público de cerca de 5500 pessoas. Se fosse presencial, a expectativa seria segundo um membro da comissão organizadora, de não ultrapassar 600 participantes. Quase 10 vezes mais médicos puderam aprimorar o conhecimento na área!
Mais recentemente, uma outra sala virtual, foi criada para discutir casos clínicos complexos de uma determinada enfermidade com um grupo de especialistas do Brasil todo, de várias especialidades (coloproctologistas, radiologistas, oncologistas,...). Após discutir cada caso online, a tomada de decisão fica mais clara e beneficia enormemente o paciente. Além disso, permite a todos nós crescer muito em conhecimento. Alguns hospitais ou grupos de médicos do Brasil faziam essa atividade de forma presencial e passar para virtual foi apenas uma questão de ajuste. No entanto, a maioria absoluta dos especialistas na minha área nunca tiveram essa oportunidade de levar seus casos mais difíceis e compartilhar a decisão com outros especialistas que possam eventualmente estar mais familiarizados com aquela determinada situação, ou eventualmente mais atualizados em conhecimento científico.
A importância dessa maneira de adquirir conhecimento é tão grande que é difícil de ser mensurada, e especialmente difícil de se fazer a previsão de como vão ser os eventos habituais quando houver uma vacina eficaz para acabar com a pandemia. Um dos índices que mostra o quanto as reuniões virtuais e educação à distância são importantes é o valor de uma das empresas criadoras de uma das plataformas mais usadas que viabiliza esses encontros: tinha ações na bolsa valendo US$65 em janeiro/20 e passou a US$275 agora em julho/2020. O valor da empresa aumentou mais de 4 vezes em 6 meses. Indício de que no futuro essa tecnologia deve ser muito mais adotada em todos os segmentos.
Tomara que o isolamento social acabe, mas que as ferramentas que trouxeram mais possibilidades à educação médica continuem existindo e melhorando. Precisamos dela para manter e melhorar a informação difundida, para termos mais embasamento teórico atualizado, e no final, o que realmente importa: sempre elevar o padrão de assistência aos nossos pacientes.
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